Constantemente avaliados

Espaço do Nando
CONSTANTEMENTE AVALIADOS


Em uma noite destas em que bate a insônia, ao invés de contar carneiros, resolvi fazer um momento de reflexão, pensando como nossas vidas são marcadas por constantes processos de avaliações, exames e testes. Descreverei neste texto, o resultado da minha "meditação de travesseiro", levando-se em conta desde o momento da fecundação do indivíduo até a passagem para a outra vida. Eis aqui o resultado:


Já no processo reprodutivo, é realizada uma corrida entre milhões de espermatozoides, buscando fecundar um óvulo e lutar pelo direito de vir ao mundo. Pré-natal, teste do pezinho, do olhinho, avaliações periódicas de peso e altura passam a fazer parte da rotina do bebê, depois do mesmo ter nascido. Na infância, as crianças são avaliadas pelos próprios pais, pelo Papai do Céu e pelo Papai Noel, que formam uma banca e analisam todo o comportamento anual, no intuito de decidir se é merecido ou não receber um presente em dezembro. Na sequência, vem a vida estudantil: provas, provas e mais provas. Eis que surge agora, um profissional expert em testes - o professor.


Na adolescência, ocorre o processo informal de avaliação realizado pelos grupos e a busca pela aceitação nos mesmos; (período complicado e cheio de dúvidas). Ao final do Ensino Médio, o tal do ENEM e o vestibular. Provas na faculdade, exames para conseguir a carteira da habilitação, entrevistas de empregos, concursos públicos, enfim, uma enxurrada de testes tomam conta do cotidiano do até então, jovem vivente . A vida profissional e conjugal não priva o indivíduo já adulto das avaliações, muito pelo contrário. Patrões, cônjuge, filhos, a sociedade, todos cobram resultados e alimentam expectativas, é um processo praticamente inevitável.


Enfim, chega a terceira idade. Parece que finalmente, tantos testes darão uma trégua na vida do herói, (ou heroína), em questão. Grandioso engano. O corpo começa a dar sinais de cansaço e perda de saúde, sendo que as avaliações e exames médicos tornam-se uma constante. E o que é pior: os resultados já não são tão animadores quanto em outrora. Como se não bastasse, o sistema previdenciário e a instituição bancária que faz o pagamento da merecida aposentadoria, periodicamente exige uma tal “prova de vida”, para que se evitem fraudes.


Mas um dia os olhos finalmente se fecham, e parece que a maratona de testes passou. Enfim, chegou o merecido descanso da vida terrena. Porém, surge na frente do recém desencarnado, um último julgamento, que levou em conta nada mais nada menos do que TODO o seu comportamento em vida, numa avaliação final, onde o indivíduo saberá se irá para o céu, para o inferno, ou em caso de dúvidas, para o purgatório, que é uma espécie de “repescagem das almas”. Gente, é muita pressão! Acham que depois de tudo isso consegui dormir? Muito pelo contrário. Perdi o sono de vez! Na próxima insônia, usarei a tática menos complexa de contar carneiros...


Fernando Freitas é Funcionário Público Estadual e escreve às quartas-feiras.