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quinta-feira, 5 de abril de 2012

O Tempo

Post do Luciano
O TEMPO


Ele ainda era adolescente quando casou-se. Digo adolescente porque era como se comportava e como todos o viam. Divertido, amigo demais e falante ao extremo; ao ponto de alguns chegarem a dizer que falava mais do que deveria ou poderia em algumas situações.


O tempo passa e vêm os filhos. Com eles aprendeu coisas inusitadas: Que o “cocozinho” de um bebê pode ser mais fedorento que o seu; que o sorriso de um filho cura qualquer noite mal dormida encorajando outras tantas; que a princesa de outrora por vezes se reveste de bruxa má ordenando e obrigando a fazer coisas nos momentos em que menos gostaria de levantar do sofá; que filhos devem ter a preferência hoje para não reclamarem ausência no futuro; que trabalho pode ser divertido, sobretudo às quintas quando a sexta é feriado ou véspera das férias.


E a força da pós juventude ia motivando- o a realizar coisas inimagináveis. Poderia trabalhar 30 horas ininterruptas apenas para não deixar ao chefe carrasco o sabor da vitória quando concluísse, com aquela voz de atendente de velório, a frase que cairia em sua cabeça com a leveza de uma marreta: “imaginei que não conseguiria”.


Desafios e mais desafios. A fase de superação parecia não acabar jamais. Os dias acumulavam diversos afazeres que iam desde cortar a grama até limpar algumas gavetas proibidas às faxineiras ou a qualquer pessoa que fosse. Sua vida tinha particularidades que nem mesmo ele gostaria de dividir. Guardava bobagens das mais diversas. Uma concha para cada viagem à paia, um bilhete da adolescência, sua primeira caneta da escola que ficava sempre ao lado do último lápis da oitava série.


Uma mente criativa e extrovertida que tudo observava um dia se rendeu a realidade de não conseguir entender tudo. Não entendia por que a vida havia mudado tanto. Por que temos de crescer e nos transformar naquilo que todos esperam de nós quando, na verdade, os adultos nunca deixam de ser crianças crescidas e frustradas por não poderem sentar- se na calçada e simplesmente baterem um bom papo com outro colega que veio sem ligar antes.


Passeando por esses devaneios viu quando sua esposa passou saindo do banho. Deu uma boa olhada e percebeu que o tempo mudara seu mundo ao mesmo tempo em que transformara seus corpos, mas uma coisa continuava igualzinho... o amor que sentia por aquela mulher.


Luciano Esposto é poeta e escritor venceslauense.

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