Fernando Olmo
O HOMEM QUE FLUTUAVA
“A
vida é maravilhosa se
não se tem medo dela.”
Charles Chaplin
Lá vinham eles ladeira abaixo mais uma vez...
O garoto tinha que lhe amarrar pela jugular para que não se dispersasse. De tão
leve o sujeito boiava no ar puxado pelo seu filho nas ruas da cidade.
Flutuando, o homem deitava de costas quando se cansava [se posso dizer
cansava..., virava de bruços e também de ladinho. Até nadava... Tudo bem
calmamente lá do alto conversando com seu moleque. Se alguém via isso? Sim!
Apenas não davam bola... Os senhores estavam demasiadamente ligados aos
problemas e não havia espaço para cuidar de um cara voando por ai... As
senhoras os fitavam passando espantadas. Seguiam-nos estarrecidas com os olhos
até quebrar o pescoço. Mas, bem rápido voltavam para as suas preocupações
diárias e já esqueciam o inacreditável. Os ébrios no botequim achavam que fosse
efeito da cachaça e pediam mais uma... Jovens temiam contar sobre o
acontecimento e alguém pensar que fosse efeito das drogas e outros mais
deixavam de apontar o fenômeno com medo de sofrer as conseqüências num
manicômio. _ Vou falar nada... É
problema! Vai que me dão por louco. – diziam uníssonos. Nessa, apenas as criancinhas achavam o máximo
tudo aquilo. Seus familiares quando as ouviam falar não lhes davam atenção... _ Liga não, é fantasia de criança. –
dizia uma vovozinha. E, serelepes, cochichavam uma com as outras que deveria
ser o máximo soltar pipa com o papai. Mais legal ainda quando o papai era a
própria pipa...
O homem
que voava pelos logradouros dos arredores tinha absolutamente preocupação
nenhuma não... Apenas curtia o role com o seu pimpolho parecendo um balão de
gás hélio. Esse era o seu maior prazer... Tá bem que o menino ficava um pouco acanhado
de ter que puxar o seu amigão no ar, mas adorava...
Tudo começou quando o cara de tanto se
preocupar, correr, estressar, chorar e sofrer, de repente, despreocupou...
Prometeu que a partir daquele santo dia não iria se irritar com mais nada...
Desprezou de uma vez por todas suas adversidades e controlou o estresse. Entupiu-se
no início de erva-cidreira, mas deu certo... A pressão que antes era sempre
alta despencou. Agora é só relax...
Lembrou-se que tinha mulher e filho e passou
a agradá-los, coisa que há muito não fazia... A nega de pronto assustou com
aquele novo mesmo homem e pôs-se a apalpar-lhe as partes para ver se não era
febre ou doença ruim. E sobre ele perambular pelo ar, fez que nunca viu...
Jamais disse isso a alguém para lhe evitar dissabor. Tinha medo de complicação...
No entanto, o filhote era só alegria... Quando não estava a conduzir o genitor
para cima e para baixo amarrado a uma tira de pano [que, afinal de contas, era
uma baita diversão], tava brincando com ele de videogame, de esconde-esconde,
jogando bolinha de gude... Virou o pai-herói dos sonhos [não obstante o guri,
no fundo, no fundo, pensasse que o seu velho estivesse pirando, mesmo.].
O novo
mesmo homem apenas descomplicou... Tava pirando nada. Aliás, despirou... Só não queria morrer sem ter
o seu melhor valor..
- E o
aluguel, a mensalidade da escola do filho, o pagamento do plano de saúde, as
prestações mensais, a rincha com o vizinho e o trabalho? Isso não tem que ser
preocupação, hein? – provocava um tolo
familiar.
- Corra! Vá! Já! Pegue ali, lá, acolá! –
irritava o patrão.
Enfim, tentavam infrutiferamente
desconsertá-lo. E, por mais que insistissem nesse intuito, ele diferente de
outros tempos apenas sorria. O tamanho do sorriso era proporcional à pressão
que lhes faziam... Não deixou de cumprir seus compromissos, bem pelo contrário.
Só não os viam mais como problemas; não os temiam... Resolveu, terminantemente,
que tinha de viver mais sabores e que ele era gente importante, principalmente,
para os seus.
Dispensou
a mágoa, depois o ódio e a inveja, a cobiça, a falácia e parou de reclamar... E
foi ficando leve. E dia após dia que deixava um desprazer, ficava mais leve. E
paulatinamente, cada vez mais leve até que pluft...
Boiou no ar de felicidade.
Fernando Olmo é educador.
Pertence à AGAPE – Academia Geral de Artes de Presidente Epitácio.
Blog: http://olmo.zip.net
E-mail: fernandoolmoprof@hotmail.com
2 comentários:
Seu texto é simplesmente bárbaro!
Me diverti muito e penso que a outros também.
Parabéns amigo. É assim que tiraremos as pedras do caminho.
Grande abraço.
Obrigado pelo seu afago, amigo Luciano Esposto. Te acompanho também e merece toda minha [nossa] consideração. É um exemplo em pessoa para a querida Presidente Venceslau e região. Meu carinho!
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